ECONOMIA
Opinião: Eleitores de 2022, o que esperar em 2021?
Ano de 2021 está na porta e não temos ideia clara do plano governamental para suportar a maior crise humanitária da história.
Publicado em 05/12/2020 às 7:14 | Atualizado em 05/12/2020 às 11:53
A previsão da Organização das Nações Unidas (ONU) para 2021 é de uma crise humanitária global que superará o pós 2ª Guerra Mundial. Por outro lado, projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial indicam para uma retomada da economia.
O problema é que nenhum país do mundo estava preparado para suportar os efeitos sociais e econômicos da Covid-19. E geralmente são com as crises que a faceta negativa das escolhas econômicas aparecem na sua forma mais perversa, entrelaçando sabores e dissabores, do ruim ao bom.
No Brasil, o funcionalismo público não sentiu financeiramente a dor do empregado privado, mas ambos foram impactados pela alta dos preços, inflação. O empresariado iniciante sofreu demasiadamente com a recessão oriunda do lockdown, e o empresário já experiente, a depender da atividade, zerou a renda e o caixa, mantendo apenas o essencial. A verdade é que a maioria das médias e pequenas empresas brasileiras não possuem caixa para sobrevida de um mês, sendo o capital de giro muitas vezes financiado.
O fato é que, pela conjunção dos anúncios do Governo, apesar da retomada da economia com base na notícia do PIB do último trimestre, está por vir um ano econômico e socialmente incerto. Dólar alto, fuga de investidores, ausência de recursos para continuar com os auxílios e para realizar investimentos e obras públicas. O desemprego está em alta e a inflação, caso não se tenha dinheiro ou condições para postergar o pagamento dos títulos públicos, tenderá a crescer e a alta do preço do arroz nem será lembrada diante do que pode ocorrer. A tendência é que dívida pública, em valor, aproxime-se do Produto Interno Bruto (PIB), isto é, da quantidade de riqueza produzida pelo país, como só aconteceu com a nossa vizinha Argentina (dívida pública em 98,7% do PIB).
Nessa toada, como implementar as medidas de contenção e de recuperação estipuladas pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em seu recente documento denominado “Tax and Fiscal Policy in Response to the CoronaVirus Crisis: Estrengthening Confidence and Resilience”? Em outras palavras, como manter as medidas e políticas tributárias de liquidez para assegurar a capacidade de pagamento das empresas e a sobrevivência das pessoas, assim como criar estímulos fiscais necessários para expansão dos investimentos e do consumo?
A resposta passa pela compreensão literal do termo “política”, que nada mais é do que a resolução de conflitos ou um conjunto de procedimentos formais e informais que expressam relações de poder e que se destinam à resolução pacífica dos conflitos quanto aos bens públicos (SCHMITTER, 1965). A política é diferente de direito, economia e finanças, mas com todos esses ramos se entrelaça. Existe desde que o homem se organizou em sociedade e negá-la não é uma saída, sendo atemporal a frase de Platão segundo o qual “não há nada de errado com aqueles que não gostam de política, simplesmente serão governados por aqueles que gostam.”
Talvez esteja na hora daqueles que dizem que não gostam de política governarem junto daqueles que claramente demonstram que gostam de fazê-la. O ano de 2021 está na porta e não temos ideia clara do plano governamental para suportar a maior crise humanitária da história e alavancar a economia.
O professor Fernando Scaff (Titular de Direito Financeiro da USP), recentemente, em artigo publicado na sua coluna do CONJUR intitulado “Reforma tributária: política se faz com gastos, estúpido!”, afirmou categoricamente que nenhum Presidente brasileiro teve tanta liberdade para gastar sem amarras quanto o atual. O teto de gastos e as punições da Lei de Responsabilidade Fiscal foram liberadas até o final de 2020 sob a justificativa de combate à pandemia, mas ao invés de concentrar os gastos na saúde, estes foram colocados em segundo plano e a aposta se deu nos cerca de 50 bilhões por mês do auxílio emergencial.
Não entendemos que o auxílio emergencial foi uma política errada. Neste ponto, ou seja, em conjunto com as medidas de postergação das exações e obrigações tributárias, auxílios trabalhistas e a política monetária, o Governo deu respostas imediatas e sobrevida às empresas e pessoas, seguindo a orientação da OCDE. Entretanto, o professor Scaff concluiu que os gastos com saúde não se deram na proporção que deveriam, visto que poderiam inflar o balão político de governadores e prefeitos, e que o presidente focou no auxílio emergencial porque teria o seu carimbo. Mas, longe de criticar a política governamental, até porque a população merecia sim o auxílio, negar a pandemia e a relegar a saúde a própria sorte talvez não tenha sido a melhor escolha, até porque as previsões já eram desoladoras e que vacinas só teríamos em 2021.
A OCDE frisou bem na sua publicação que a terceira fase seria com a reabertura da economia, e a retomada está aí com a notícia do PIB do último trimestre. Entretanto, já deveriam ter sido criados estímulos fiscais suficientes para o crescimento do consumo e investimentos. Medidas financeiras foram tomadas, a exemplo da queda dos juros. Isso aumenta a oferta de crédito. Inclusive, foram concedidos créditos para as micro e pequenas empresas. Mas, e as medidas tributárias? Não seria o momento adequado para possibilitar, por exemplo, a compensação de prejuízos fiscais e conceder parcelamentos especiais com redução de multa, juros e prazos de pagamento prolongados? A transação tributária foi uma ótima medida, mas somente ela não resolve.
Uma reforma tributária mínima com a substituição de alguns tributos por outros de bases mais amplas e que privilegiem efetivamente a capacidade contributiva também é uma das saídas (exe. Imposto sobre Transações). Contudo, falhou o Governo e falhou o Congresso porque faltou política! Não existiu bom-senso e articulação efetiva por parte dos nossos políticos para aprovar um único projeto relativo a reforma tributária. De outra banda, faltou liderança e capital político para cortar gastos públicos, culminando também no atraso do envio da reforma administrativa e na manutenção de privilégios no pacote.
Se não tem Política não há como se ter reformas efetivas que visem a recuperação econômica, e não se terá plano para governabilidade. Precisamos de “atitudes, porque palavras o vento leva” (autor desconhecido). Isto é, para a retomada da economia ser real, os empresários precisam de política fiscal e a diminuição do custo com a máquina pública deve ser efetiva. Ainda há tempo, e nós brasileiros temos a esperança de que as portas de 2021 serão talhadas por um líder que articulará a boa política necessária para o futuro do nosso país.
* Felipe Crisanto é advogado especialista em Direito Tributário, professor e diretor fundador do Instituto de Pesquisas Fiscais (IPF)
Comentários