ESPAÇO OPINIÃO
Feliz dia de todas as paternidades
Por Cleudo Gomes
Publicado em 10/08/2025 às 9:23 | Atualizado em 11/08/2025 às 9:41

Neste segundo domingo de agosto, estamos comemorando o Dia dos Pais. Mas, o que temos para comemorar? E de que pais estamos falando?
Daquele pai que é bissexual e apanhou essa semana na rodoviária de JoãoPessoa na frente de seu filho pelo simples fato de ter uma outra orientação sexualtida como uma minoria em nossa sociedade machista e patriarcal.
Ou será que estamos falando daquele pai ausente, mas que hoje apareceupara o almoço familiar desse domingo, aproveitando a ocasião de tirando dezenas de fotos lindas e “instagrameáveis” para suas redes socias.
Não posso esquecer daquele pai que foi comprar “cigarros” e nunca mais voltou para casa, porque não aguentou sabe que sua filha é uma mulherassumidamente lésbica e por isso o temor e pavor do pré-conceito alheio falou mais alto e daí, aquele preferiu fugir.
E ainda tem aquele pai que abandonou a mulher grávida e nunca mais voltou para saber se ela ou a criança estão bem. Mas, infelizmente a genitora morreu no parto e hoje seu filho vive em uma unidade de medidas socioeducativa, depois de ter passado 15 anos internado em um orfanato na capital paraibana.
Essas situações pontuadas nesse texto poderiam apenas ser um devaneio do seu autor que foi criado apenas por sua mãe e que nunca conheceu o próprio pai. Contudo, essa é uma síntese da sórdida realidade brasileira, em que a maioria dos jovens negros e negras das periferias de todo território nacional vivem na atualidade.
Nas rodas de diálogos entre pessoas LGBTQIA+ é recorrente esses relatos de abandonos paternos, rejeições, violências físicas e abusos psicológicos, morais e até sexuais para que aprendam a serem pessoas cisgêneros e heterossexuais, tendo em vista que a extrema direita ganhou força política no Brasil e no mundo com discursos religiosos que beiram o neofascismo em vários continentes.
O próprio lar tornou-se um ambiente hostil, violento e perigoso para adolescentes e jovens trans, sobretudo para homens trans que são ameaçados no tido “seio familiar”, daí o medo dos parentes do gênero masculino, tendo em vista o crescente número de estupros corretivos.
Sendo assim, cabe destacar que hoje é dia de todas as paternidades e de todas as experiências de paternagem, sejam essas vivências como amor e afeto, como é o caso das inúmeras adoções de crianças e adolescentes por casais homoafetivas.
A dupla maternidade que às vezes é confundida por paternidade, porque a mãe substitui o pai ausente é uma fase muita cruel para as mulheres que são chamadas de “guerreiras”, mas na verdade são apenas mães com tripla jornada de trabalho para bancar o sustento de seus filhos.
A criação de crianças e adolescentes pelas mães solos tem uma cobrança exacerbada da sociedade em geral, em que as mulheres precisam mostra que sabem cuidar, educar e disciplinar seus filhos e filhas com rigor e amor, já que são tidas como sendo o “sexo frágil”. Daí, elas incorporam para si a famosa frase de um autor desconhecido, “é preciso endurecer, mas sem jamais perder a ternura”.
Essa citação é constantemente atribuída a Che Guevara, mas não há registros oficiais que ele fez essa fala.
E por fim, o que podemos fazer se nem todas as pessoas que conhecemos têm pai e mãe vivos. Que tal ligar no celular e não manda apenas card, vídeos e posts repetitivos pelos aplicativos de mensagens de textos.
Quando a pessoa atender o telefone, diga apenas que sabe que hoje não é um bom dia para ela, mas que gostaria que soubesse o quanto você o admira, torce por ele ou ela e que está aqui disposto e disponível para o que dê e vier. E que na ausência do pai, da mãe ou até mesmo da família, a pessoa pode contar com sua amizade para sempre.
Enfim, poderia finalizar parafraseando uma linda canção de Milton Nascimento, entre elas, “Coração Civil” que foi magistralmente interpretada por Ney Matogrosso em sua última turnê, especialmente no trecho inicial em que Bituca escreveu “quero a utopia, quero tudo e mais... quero a felicidade dos olhos de um pai”.
Nesse ano de 2025, tivemos a oportunidade de conhecermos nas telonas do cinema, o senhor Matogrosso, pai de Ney, o qual foi retratado na cinebiografia “Homem com H”, com roteiro e direção de Esmir Filho e estrelado pelo talentoso Jesuíta Barbosa que viveu a juventude e a fase adulta de um dos maiores interpretes da MPB. No longa-metragem, o ator sentiu na pele, “a dor e a delícia de ser o que é”, no caso, um homem assumidamente gay.
Esse é uma das celebres frases de compositor Caetano Veloso, na canção “Dom de Iludir. Nesse parágrafo vou soltar um breve spoiler do filme, Ney sofria violência física em sua infância e juventude, mas perdoo o pai, porque o amor venceu no final, apesar de todas as agressões e brutalidade que aquela criança sofreu no
Estado do Matogrosso, mas que explodiu no Rio de Janeiro e hoje continua fazendo sucesso por onde passar aos 84 anos de idade. Mas para concluir, eu vou recorrer a um jovem fenômeno musical que “esperaçou”no interior de Pernambuco, onde era ajudante de Pedreiro em Petrolina junto com seu pai e hoje é famoso em todo o país e faz questão de falar de suas origens em suas músicas.
Eu vou parafrasear a canção “Obrigado Deus”, do cantor e compositor nordestino Léo Foguete, porque “eu vou amar mais”, vou “agradecer ao invés de reclamar, vou correr atrás, sei que sou capaz, de ser exemplo pros meus filhos e orgulho pros meus pais”. Como diria um dos meus mestres da Educação Popular, o professor Pedro Cruz, hoje no meu coração eu só tenho “afeto, gratidão, alegria, aprendizado, superação, sentido e amorosidade”.
Cleudo Gomes é ativista de Direitos Humanos, Doutor em Educação, na linha de Educação Popular/PPGE/UFPB
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