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ESPORTES

Travessia de Kay France completa 35 anos

Como uma menina que não sabia nadar entrou para a história do país ao atravessar o canal da mancha.

Publicado em 19/08/2014 às 6:00 | Atualizado em 08/03/2024 às 17:21

Dezenove de agosto de 1979, 22h53. Wissant, França. A paraibana Kay France se levanta e dá seus primeiros passos em território francês. Ela está radiante. E é cumprimentada por uma pequena multidão. Seu pai e treinador, no entanto, é o primeiro a chegar até ela. Pai e filha se abraçam. Só eles sabem o que passaram juntos até chegar aquele momento. Ele está em êxtase. Ela, emocionada.

O grupo que lhe espera na praia ensaia uma comemoração mais calorosa, apesar do frio que faz na região. É o momento exato em que a garota de apenas 17 anos finaliza, após 11h36min de natação ininterrupta, a travessia a nado do Canal da Mancha, tornando-se a primeira latino-americana e a mais jovem do mundo até então a realizar tal feito.

Uma marca histórica que nesta terça-feira completa 35 anos. Ainda mais impressionante porque poucos anos antes, quando Kay decidiu realizar a travessia, ela nem mesmo sabia nadar. Aos 12 anos, nunca nem mesmo tinha entrado numa piscina.

O início da história

A história começa em 1974, em João Pessoa, na Paraíba, a terra natal de Kay France. E em cinco anos de aventura, tudo aconteceu. Tudo mesmo.
Ela fez uma primeira travessia extraoficial do Canal da Mancha em 1978; deixou seu nome na história do canal no ano seguinte; e desistiu da natação após fazer tudo isto, em meio a convites para competir nos Jogos Olímpicos de 1980. Estava cansada. Dos esforços e da falta de apoio.

E 35 anos depois, ela desabafa: "Ninguém acredita em você até a hora que você consegue. A partir daí, todos querem ter uma participação em suas conquistas".
Ela conta que estava em casa, em meio a estudos e leituras, quando viu na extinta Revista Realidade uma reportagem sobre a travessia do canal.

O texto falava do pioneirismo de Abílio Couto, mas ponderava que nunca uma mulher da América Latina tinha conseguido realizar tal façanha. Foi como uma droga. De efeito imediato. “Bem que uma menina da Paraíba poderia ser a primeira a fazer isto”, ela pensou.

Aulas de natação

O primeiro esforço vencido foi o de convencer o pai a lhe matricular nas aulas de natação do Clube Astreia. Kay passou a ter duas sessões diárias de treinos na piscina. Em pouco tempo aprendeu a nadar e quando isto aconteceu passou a treinar aos domingos no mar do bairro de Cabo Branco. Vencendo distâncias cada vez maiores.

Como não havia dinheiro para um barco, as travessias de Kay em mar aberto eram precárias. Ela e o pai corriam oito quilômetros de casa até o ponto de início da natação e neste momento Kay entrava no mar.

O pai acompanhava a travessia por terra, observando-a e caminhando na medida em que ela ia avançando pela água. De início, ele não sabia das reais intenções da filha, mas mesmo quando descobriu não conseguiu demovê-la da ideia. E a única saída foi apoiá-la.

Treinamento deixou Kay à deriva

A rotina de Kay permaneceu inalterada até o carnaval de 1976, quando ela e o pai foram para mais uma sessão de treinos. Ela entrou no mar à tarde e, por causa de uma deficiência em seu estilo de natação à época (até então ela só sabia respirar para um dos lados), ela nadou sempre olhando para o lado oposto da praia e não percebeu que a forte correnteza lhe jogava cada vez mais para o fundo.

Os gritos desesperados de seu pai em terra não foram ouvidos e quando ela percebeu já estava tão longe da costa que nem era mais possível enxergá-la. Ela calculou mais ou menos o lado em que deveria estar a praia e voltou a nadar, já noite, e sendo atacada por “baratas d’água” que lhe feriam o corpo.

O pânico durou entre quatro e seis horas e quando Kay France finalmente pisou em terra firme estava na Praia do Poço, em Cabedelo. Machucada e cansada, ela entrou numa casa. E a resposta foi inusitada: “Você deve ser a menina que estão falando em todas as rádios”.

Kay ficou famosa. Primeiro em João Pessoa, depois em todo o Brasil. Quando o jornal sensacionalista Notícias Populares, de São Paulo, contou a história da menina que “ia ser devorada por tubarões” ao treinar para atravessar o Canal da Mancha, todos os principais jornais e revistas do país quiseram contar e acompanhar sua história. E ela virou uma celebridade.

Detalhes da travessia

A primeira ideia de Kay era tentar a travessia em 1977. Mas sem dinheiro e com os treinos em andamento desistiu da ideia. Fixou o ano de 1978 como nova meta. Chegou a fazer a travessia de forma extraoficial em um treino, mas, no dia previsto, um acidente entre embarcações fechou o Canal da Mancha. O sonho estava novamente adiado.

De volta ao Brasil, Kay France retomou os treinos na Paraíba. E com isto a briga por patrocínios para fazer a travessia em 1979. A sua sorte mudou em 26 de junho de 1979, quando o Globo Repórter dedicou todo um programa para falar dos esforços da atleta.

O apelo deu resultado e uma empresa de Pernambuco resolveu apoiá-la. No final de julho ela viajou novamente para a Inglaterra e se instalou nas redondezas de Dover, a cidade que era o ponto inicial da travessia.

O tempo na Europa estava adverso. Eddie Ottley, que era o responsável por estudar as rotas e apontar o dia ideal para a travessia, enfim deu a boa notícia no dia 19 de agosto. “É hoje. Peguem tudo”, foi a frase do piloto, segundo as lembranças da atleta paraibana.

Kay France chegou à Praia de Shakespeare bem cedo e começou a se preparar. Ela começou a nadar exatamente às 10h57, sendo acompanhada por um barco que levava seus pais, o observador (responsável por atestar que todas as regras foram seguidas e que a atleta de fato fez a travessia) e uma equipe da TV Globo.
"Durante a travessia, só pensava em voltar ao Brasil e mostrar às pessoas que a gente pode conquistar tudo o que deseja" declarou Kay.

Ela retornou ao Brasil alguns dias depois. Aclamada, mas triste com o descaso do poder público. Na época, desabafou: "Foi mais difícil chegar à Inglaterra do que atravessar o Canal da Mancha".

Com este espírito, ela desistiu do esporte. Negou convite para competir nos Jogos Olímpicos de 1980, em Moscou.

Kay France continua morando em João Pessoa. Formou-se em Medicina na UFPB e hoje trabalha no Samu. A ex-nadadora tem dois filhos e uma neta.

Imagem

Jornal da Paraíba

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