POLÍTICA
Comissão da Verdade fecha primeiro relatório
Estado divulga relatório sobre crimes ocorridos durante a ditadura militar na Paraíba, após um ano de trabalho da Comissão da Verdade.
Publicado em 01/04/2014 às 6:00 | Atualizado em 16/01/2024 às 15:19
Mesmo após 50 anos, os efeitos marcantes do Golpe Militar ainda ecoam na Paraíba. O governo do Estado divulgou ontem o resultado preliminar do primeiro ano de trabalho da Comissão Estadual da Verdade, um relatório sobre os crimes ocorridos nos bastidores da ditadura na Paraíba, e autorizou a regularização fundiária da fazenda 'Alagamar', no município de Salgado de São Félix, símbolo da resistência ao regime militar. A medida vai beneficiar diretamente 300 famílias que passarão a ter a posse da propriedade.
Em 12 meses, a Comissão realizou 13 audiências públicas para ouvir 40 pessoas que sofreram algum tipo de violação de direitos durante a ditadura. Também ontem, o governador Ricardo Coutinho autorizou a mudança do nome da escola estadual Presidente Médici, no Castelo Branco, para presidente João Goulart, após a aprovação de 87% dos alunos.
“Esse trabalho tem a importância de resgatar a verdade, preservar a memória. Nenhum povo pode construir o futuro sem conhecer o passado. Durante 21 anos houve no país um regime discricionário e é preciso que as novas gerações possam conhecer esse lado da nossa história e fazer com que a partir da verdade o país evite qualquer coisa parecida com isso no campo da supressão das liberdades individuais e coletivas, no campo da tortura, na ausência de democracia. Existe isso para construir um país bem melhor para os seus filhos”, avaliou o governador Ricardo Coutinho.
O Estado totaliza cinco mortos, sendo apenas três reconhecidos pela União e outros seis desaparecidos políticos.
No solo paraibano, 35 pessoas foram torturadas durante o regime militar, alguns destes casos foram constatados a partir das audiências públicas realizadas pela Comissão da Verdade.
O relatório da Comissão Estadual da Verdade traçou um mapa da tortura na Paraíba. Conforme o documento, as torturas aconteciam no interior dos batalhões do Exército Brasileiro, no 15º Batalhão de Infantaria Motorizado, no bairro de Cruz das Armas, 1º Grupamento de Engenharia, Delegacia da Agricultura, 16º Regimento de Cavalaria Mecanizado, além da Delegacia Regional de Sapé e na Delegacia de Investigação e Captura (DIC).
Em Campina Grande, as torturas ocorriam em granjas privadas que eram cedidas para a prática dos crimes. Entre as torturas praticadas estavam: interrogatórios com socos e pontapés, choques elétricos com fios conectados nas orelhas e nos órgãos sexuais, além de ameaças. De acordo com o presidente da Comissão da Verdade, Paulo Giovani, os principais torturadores dos paraibanos foram o major José Bendito Cordeiro, conhecido por major Cordeiro, o coronel Carlos Alberto Ustra e o sargento Francisco de Assis Marinho, apontado como torturador nas granjas de Campina Grande.
“Nesse ano de trabalho, nos organizamos em grupos e cada um desenvolveu temáticas. Foram 10 grupos temáticos e apresentamos o resultado preliminar de nove destes grupos”, explicou Paulo Giovani. Na 'Anos de Chumbo', 41 mandatos eletivos foram cassados na Paraíba, entre deputados, vereadores, suplentes e prefeitos. As cassações ocorreram em três momentos: através de Projetos de Resolução, editados pelos Poderes Legislativos, a partir do Ato Institucional 1 (AI1) do governo federal e pós AI5, quando as cassações ocorreram através do Conselho de Segurança Nacional.
O governador informou que a sala utilizada para os trabalhos da Comissão, na Fundação José Américo, será transformada no Museu da Democracia da Paraíba. No local serão disponibilizados documentos e depoimentos em vídeo colhidos ao longo do trabalho da Comissão.
“Acho que isso constrói não só o sentimento mas mentalidade do quão importante é um processo democrático na vida de um país”, disse Ricardo. O trabalho da Comissão continua por mais um ano, quando será emitido um relatório final que fará parte da Comissão Nacional da Verdade.
MULHERES VÍTIMAS DA DITADURA MILITAR
A Comissão Estadual da Verdade identificou 100 mulheres paraibanas que foram vítimas de violação de direitos humanos durante a Ditadura Militar. Conforme Irene Marinheiro, que estudou ditadura e gênero na Comissão, uma das principais metas é tornar público as aberrações sofridas pelas mulheres durante o Regime Militar.
Conforme o relatório da Comissão, foram mães, esposas, filhas, companheiras que sofreram todo tipo de tortura, desde o choque elétrico à violência sexual. “Foram prisões, torturas, exílio, clandestinidade, afastamento da universidade. Existem casos de violência sexual. As mulheres tiveram papel importante no enfrentamento à ditadura e foram duramente reprimidas”, informou Paulo Giovani.
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