CONVERSA POLÍTICA
Bolsonaro quer a imprensa ajoelhada a seus pés, sem questionar, mas na democracia não é assim
Publicado em 22/06/2021 às 7:45 | Atualizado em 30/08/2021 às 18:55
Por LAERTE CERQUEIRA e ANGÉLICA NUNES
O presidente Jair Bolsonaro quer os órgãos de imprensa ajoelhados a seus pés. Subservientes. Quer jornalistas pedindo a benção. Batendo continência. Não terá esses gestos no sistema democrático. A imprensa na democracia questiona, fiscaliza, desvela, aponta erros, pede explicações em nome da sociedade.
É que na democracia a lei é regra. Se não gosta da lei, recorre-se aos caminhos institucionais para mudar. Não se muda as regras com coices. O questionamento tem espaço. A transparência da gestão pública é obrigação. Gestor tem que explicar. Não se ganha no grito e não se governa por decreto.
Bolsonaro quer jornalistas agindo como assessores de imprensa e publicitários pagos para servi-lo e aceitar seus surtos de insatisfação. Para que reproduzam, fielmente, o que ele quer falar, perguntando o que ele sabe responder. Criando peças para defender suas ideias.
Bolsonaro não suporta jornalistas porque eles perguntam. Autoritários não gostam de perguntas.
Ele só gosta de jornalista que deixa a bola embaixo da trave pra fazer o gol. Tem que ser fácil. Não quer o sacrifício do poder. Só as benesses.
Basta o jornalista sair do roteiro estabelecido por ele para ser vítima da estupidez autoritária.
Ontem (21), mandou uma jornalista calar a boca porque ela questionou. Fez o básico. Ele, agente público, só precisa agir como tal. Nesse caso como presidente que governa para todos e não para 30% de apaixonados. Mas ele acha que foi ungido por Deus e é muito mais do que isso. Há fanáticos que acreditam.
Atacou a Globo e reclamou da CNN. Com o mesmo desrespeito ao profissional da imprensa, de sempre. Já vimos esse desrespeito aqui na Paraíba, com políticos de outro espectro ideológico. Para gente ver que o problema está no espírito autoritário e não na cor da bandeira partidária.
O problema do presidente é com a Globo, mas também é com a CNN, a Bandeirantes, a Folha, Estadão, O Globo, O Antagonista, Nexo, Agência Pública. Qualquer empresa jornalística tradicional ou independente que não seja subserviente ao seus desejos.
Bolsonaro sabe que na democracia não é assim. Por isso prepara terreno pra sua ditadura democrática. Aparelhando as instituições. Questionando o resultado da eleição que nem aconteceu e que ele nem perdeu. Agindo para enfraquecer as instituições que sustentam o sistema republicano; criando um cenário de desconfiança para salvar o povo brasileiro do caos.
O Centrão se aproveita para fazer as vontades. Lambuzar-se e realizar os próprios desejos e do presidente. Mas quando não fizer mais e isso vai acontecer, em breve, pagará por alimentar o autoritarismo. Será também mais um inimigo a ser eliminado.
Enquanto era um deputado do baixo clero, a grosseria com jornalistas era motivo de 'brincadeira', de graça.
Agora, como Chefe da Nação, a intempestividade é ataque ao sistema democrático. Quem acha bonito, agora, pode um dia precisar da imprensa para fiscalizar, questionar, cobrar e pedir esclarecimentos sobre os problemas do seu lugar no mundo.
Na democracia terá resposta. Com um autoritário, vai ter que aceitar os gritos e imposições.
Mas sempre terá um veículo de mídia "tradicional" ou "independente" que vai enfrentar os berros, incomodar e desvendar.
Bolsonaro critica a China, mas quer a ditadura deles. Critica a Venezuela, mas quer o autoritarismo "chavista". A imprensa (que também erra e tem defeitos) vai fazer o que se exige dela: questionar, perguntar, incomodar. O presidente vai ter que aguentar. Se a gente continuar sendo um país democrático.
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