POLÍTICA
Desatentos, parlamentares viram vítimas dos 'jabutis' do Executivo
Deputados e vereadores votam sem saber acréscimos em matérias 'impopulares' .
Publicado em 10/02/2016 às 8:00
Mesmo com maioria na Assembleia Legislativa, o governador Ricardo Coutinho (PSB) recorreu à inclusão de “jabutis” em projetos encaminhados à Casa para aprovar uma série de medidas antipáticas. O prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo (PSD), também fez uso dos “jabutis” para aprovar sem maiores problemas matérias na Câmara Municipal de João Pessoa (CMJP). Os jabutis são acréscimos colocadas pelos gestores nos projetos encaminhados ao Legislativo, com a clara intenção de eles passarem despercebidos, caso haja cochilo da oposição.
Os cochilos marcaram a atuação da bancada de oposição na Assembleia Legislativa no ano passado. Sem qualquer conhecimento da pauta de votação, os oposicionistas votaram a favor de projetos de interesse do governo do Estado que repercutiram diretamente no bolso da população. Apesar de fazer barulho no plenário, na hora da votação, os parlamentares silenciaram e deixaram passar o que depois vieram a chamar de “armadilhas” colocadas pelo governador Ricardo Coutinho (PSB) em projetos do Poder Executivo.
Acreditando que estariam votando um projeto para realização de mutirão fiscal no Estado, os parlamentares aprovaram por unanimidade a elevação da alíquota do ICMS, ITCD e IPVA. Com a medida, o governo estimava aumentar a arrecadação em R$ 289 milhões. Enquanto os governistas já sabiam que o projeto tratava também do ajuste fiscal, os oposicionistas só souberam o teor da matéria no dia seguinte à sua aprovação, ao lerem o JORNAL DA PARAÍBA.
Revoltados com o que chamaram de 'cavalos de Troia', a bancada de oposição se reuniu para discutir medidas para identificar e impedir a aprovação das armadilhas do governo. Na época, o líder do bloco de partidos oposicionistas, Dinaldinho Wanderley (PSDB), afirmou que a oposição não iria aceitar as manobras feitas pelo governador e acrescentou que os projetos só seriam votados em plenário caso fossem entregues com pelo menos 24 horas de antecedência aos parlamentares para análise.
Porém, a reunião não surtiu efeito e dois meses depois, mais uma armadilha, desta vez planejada pelos vereadores governistas liderados pelo presidente da Assembleia, Adriano Galdino (PSB). E mais uma vez, os oposicionistas foram traídos pela falta de atenção. Após um mês inteiro de intensos debates e troca de acusações contra a criação do Tribunal de Contas dos Municípios da Paraíba (TCM), por unanimidade os parlamentares aprovaram requerimento de indicação proposto pela Mesa Diretora para que o governador encaminhasse à Casa uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para criação do tribunal.
Somente após alguns minutos, os deputados perceberam a manobra governista e no dia seguinte prometeram acionar a Justiça para reverter o resultado da votação. “Não sabíamos o que estávamos votando. O requerimento do TCM não foi incluído na pauta e tivemos que engolir esse sapo”, protestou Tovar Correia Lima (PSDB). Para este ano, os oposicionistas prometem ficar mais atentos às armadilhas do governador Ricardo Coutinho (PSB), na tentativa de evitar outros cochilos.
Descuidos também são comuns na Câmara de João Pessoa
Ter parlamentares desatentos não é “privilégio” apenas da Assembleia Legislativa. Os cochilos dos vereadores de João Pessoa tiraram da população um importante benefício: o IPTU proporcional. Um dispositivo para revogar a lei foi inserido pelo prefeito Luciano Cartaxo (PSD) de forma discreta em um projeto de lei que concedia desconto no Imposto Sobre Serviços (ISS) para cartórios e ampliava o parcelamento do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI).
De autoria do vereador Raoni Mendes (PTB), a lei dava desconto de até 75% no pagamento do IPTU para a população que não conta na sua rua com um dos cinco melhoramentos previstos no Código Tributário municipal, como meio-fio ou calçamento, iluminação pública e abastecimento de água. A lei foi sancionada em 2011, pelo então prefeito Luciano Agra, mas só entraria em vigor a partir de 2014. Contudo, Cartaxo não esperou o prazo e se valeu dos “cochilos” dos vereadores para revogar a lei, sob o argumento de que havia vícios de origem.
No fim do ano, Cartaxo tentou emplacar mais um “jabuti”, porém a manobra foi percebida antes da votação de um projeto que modificava o Código Tributário da capital. Na matéria, além de conceder isenção de IPTU a imóveis próprios ou locados a templos religiosos e lojas maçônicas, o prefeito pretendia incluir os nomes dos contribuintes que tivessem débitos de IPTU, TCR e ISS em cadastros de entidades de proteção ao crédito e cadastro de inadimplência, como SPC e Serasa.
Origem do termo
No processo legislativo brasileiro, 'jabuti' designa a inserção de norma alheia ao tema principal em um projeto de lei ou medida provisória enviada ao Legislativo pelo Executivo.
Este termo surgiu por analogia ao ditado popular “jabuti não sobe em árvore” usado para expressar fatos que não acontecem de forma natural.
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