POLÍTICA
Ricardo Coutinho: reajuste de servidores vai depender da receita
Em entrevista exclusiva ao JORNAL DA PARAÍBA, governador fala sobre o reajuste de servidores, impeachment de Dilma, CPMF e os planos para o futuro.
Publicado em 03/01/2016 às 13:00
Sob um cenário de crise econômica nacional, que atingiu também a Paraíba, o governador Ricardo Coutinho (PSB) encerrou o primeiro ano de seu segundo mandato. Nem tudo saiu como planejado, obras andando em ritmo lento, recursos federais contingenciados, quedas progressivas nas receitas. Nesta entrevista exclusiva ao JORNAL DA PARAÍBA, o socialista fala de incertezas sobre o reajuste dos salários dos servidores estaduais, defende a cobrança da nova CPMF, fala de ações nas áreas de recursos hídricos, segurança e saúde, além da disputa para recuperar o comando da prefeitura de João Pessoa no próximo ano. Além disso, manda um recado aos conselheiros do Tribunal de Contas do Estado sobre a polêmica envolvendo a criação do Tribunal de Contas dos Municípios.
JORNAL DA PARAÍBA - O senhor que governou seu primeiro mandato em um período de ascensão econômica, enfrentou o primeiro ano do seu segundo mandato sob forte crise. Que lição o senhor tira de 2015?
ENTREVISTADO - Tenho uma série de ensinamentos. Governar bem não é apenas realizar, é transitar em meio das piores dificuldades. A Paraíba crescia entre 9% e 11%, ao ano, ao longo desses quatro anos e também deste quinto ano, o crescimento do PIB per capita passou de R$ 8.900,00, em 2010, para R$ 11.550, um aumento superior a 30% em três anos, foi o maior aumento do PIB no Nordeste. O aumento do ICMS foi maior na Paraíba, o aumento da massa salarial foi maior na Paraíba, ou seja, os indicadores da Paraíba ao longo desses quatro anos foram os maiores e, mesmo com essa crise violentíssima, quando nós caímos de 9%/10% de crescimento para 2,8%, que nos trouxe uma série de problemas, porque a despesa não cai, só cai a receita. Mesmo com isso, os índices da Paraíba ainda são os melhores do Nordeste. Nós conseguimos passar, cortando o que podia cortar, porque eu também não posso prejudicar a maioria em nome de um segmento. Eu corto e tenho determinação para isso. E acho que também tenho que ter coragem para ter essa percepção de maioria e terminarmos o ano inaugurando obras como o Centro de Convenções, Trevo das Mangabeiras, Central de Polícia, 25 estradas. Só de escolas inauguradas 60 escolas, entre reformadas, ampliadas e ou novas, durante o ano de 2015, e já estamos em licitação com mais 60 para 2016. Pagamos todas as folhas, inclusive 13º. Só de 30 de novembro a 30 de dezembro injetamos R$ 700 milhões na economia da Paraíba.
JORNAL DA PARAÍBA - Do que foi planejado para 2015, o que saiu fora do planejado? O que deixou de ser alcançado devido à crise? Os cortes federais foram brutais no ano que passou.
ENTREVISTADO - A Paraíba tem um índice de autonomia muito forte, por incrível que pareça. Dois terços do Centro de Convenções foram com recursos estaduais, o viaduto do Geisel é meio a meio. Nenhuma obra no Brasil tem uma composição meio a meio, e olhe que desses 50% não chegou nada. O Estado está tocando a obra, inclusive em dia de domingo. Estamos nos preparando para fazer de qualquer jeito, da mesma forma o parque Bodocongó, em Campina Grande. O ano foi extremamente positivo em função das dificuldades. Não ouse você fazer algo em época de crise no país, como foi com o PIB em declínio. Mas os indicadores são muito positivos, eu sou sempre otimista.
JORNAL DA PARAÍBA - Diversos governos têm tido que fazer cortes, ajustes nas despesas, temos visto dificuldade de pagamento da folha de pagamento, inclusive na Paraíba. O cenário para este ano não traz ventos otimistas. O senhor teme o risco de haver eventuais atrasos no pagamento?
ENTREVISTADO - Temo, pois se a receita cai, não tem como saldar compromissos. As coisas são assim. Temos despesas que não são gerenciáveis, como o pagamento da dívida, que aumentou 24%, porque o dólar aumentou. É a crueldade dos números da burocracia. É dessa forma e está acabado, não podemos deixar de pagá-la. Há ainda encargos previdenciários, água, energia, combustível, que até reduz, mas combustível de polícia não tem como reduzir, tem que aumentar para poder dar uma cobertura maior. São gastos não gerenciáveis os duodécimos dos poderes.
JORNAL DA PARAÍBA - Os reajustes do salário mínimo e data-base de várias categorias, no ano passado, foram menores, algumas de só 1%. Como o senhor tem conduzido as negociações com os servidores para definir o aumento para este ano?
ENTREVISTADO - Eu só posso abrir qualquer debate sobre isso depois que eu tiver com nitidez uma análise de como vai ser o ano de janeiro e, no mínimo, o primeiro trimestre, porque é claro que eu não vou colocar em risco não só o pagamento das pessoas como o restante do Estado. É importante perceber que 3% da população paraibana tem um vínculo empregatício com o Estado e 97% que não têm vínculo, mas precisa ter o hospital funcionando, a estrada pronta, a escola para poder educar os filhos, ou seja, você precisa ser democrático. Eu não sou governador para administrar uma folha de pessoal, nunca fui, e sou servidor público. Primeiro tem que ter o interesse da maioria e segundo a regularidade dos compromissos. Esta é a primeira luta que nós temos que fazer.
JORNAL DA PARAÍBA - Como o Estado tem tratado a questão dos recursos hídricos. Grandes obras como a adutora Acauã-Araçaci sofreram quedas nos repasses federais. Também houve prisões de empreiteiros ligados a obras com a Transposição. O quanto isso pode atrasar a obra?
ENTREVISTADO - Íamos concluir 42 km da primeira etapa agora no final de 2016. Não conseguiremos em função desse contingenciamento. Onde trabalhavam 1.200 pessoas hoje trabalham 300. Evidentemente que o Estado não pode arcar com tudo isso. É uma obra de R$ 1 bilhão, muito dinheiro. Ela está recebendo cerca de R$ 5 milhões por mês e nós estamos na expectativa do país recuperar a sua capacidade. Agora, precisamos ter estabilidade, que vai ter reflexo na parte hídrica, que é um grande motor, embora apareça pouco. Estamos fazendo 800 km de adutoras, espalhadas por dentro, concluímos Pocinhos e São José da Mata, Gado Bravo-Aroeiras, Natuba-Umbuzeiro até Santa Cecília vamos acabar nesse primeiro semestre, Jandaia até março inauguramos, Pirpirituba até Caiçara e de lá para Belém e Logradouro, Sumé já inaugurou, além da adutora de Sousa. Tem muita coisa sendo feita, parte em parceria com governo federal e outras com recursos do Estado.
JORNAL DA PARAÍBA - Qual é a solução para Campina Grande, com a demora da entrega da transposição?
ENTREVISTADO - A presidente reafirmou em Floresta (PE) que até o final de 2016 entrega a transposição. É um prazo perigoso, se levarmos em conta que não vai chover absolutamente nada. Acho pouco provável. A água está vindo, já andou mais 16 km semana passada, as máquinas estão trabalhando, em alguns locais em três turnos. Em Campina Grande, com a redução de Boqueirão nós investimos mais de R$ 5 milhões de recursos próprios para poder levar o ponto de captação para um local mais profundo e não dissemos nada. Fizemos e pronto, porque senão Campina estava paralisada. É preciso se dizer que é necessário que aconteçam as duas coisas: chuva e transposição. Evidentemente, com os demais governadores do Nordeste estamos em cima.
JORNAL DA PARAÍBA - O senhor tem pleiteados quase R$ 2 bilhões em empréstimos com instituições internacionais. Embora garanta que o Estado tem capacidade de endividamento, o governo federal tem se negado a dar o aval para o financiamento. O que tem impedido?
ENTREVISTADO - Acho que o governo federal não pode continuar a agir como agiu em 2015. Não dá para misturar alhos com bugalhos, porque uma coisa era se os estados estivessem pedindo à União, ao contrário, estamos solidários a eles, mas o direito de contrair empréstimos é nosso. Mas estamos impedidos porque isso depende da Secretaria do Tesouro Nacional, porque até então eles não queriam dinheiro circulando porque isso seria uma espécie de forçação da inflação. Dinheiro circulando requer consumo e, de acordo com os liberais de plantão, pressiona a inflação. Na nossa visão, o país só pode sair do buraco se fizer investimentos, se ativar a economia. Se a inflação subir é residual, porque a que subiu não foi de crédito, foi do aumento da gasolina, componentes fundamentais, e com a instabilidade criada, a má notícia permanente.
JORNAL DA PARAÍBA - O senhor é um dos governadores que mais defendem a volta da CPMF e se comprometeu pessoalmente com a presidente em se articular com a bancada federal paraibana para conseguir aprovação da matéria no Congresso Nacional. Como tem feito para conquistar votos favoráveis, tendo em vista que boa parte dos parlamentares são oposição política ao senhor?
ENTREVISTADO - Com alguns deles, sim. Com outros tenho preferido fazer um debate com a população. Acho justo que quem ganhe mais pague CPMF para colocar recursos na saúde. Não existe essa utopia de viver num país que não tenha imposto, mesmo os que têm uma situação financeira resolvida, como a Suécia, têm uma carga tributária altíssima. Não podemos simplesmente dizer que precisamos melhorar a saúde retirando e negando dinheiro. Aqui em João Pessoa e Campina Grande, o cidadão pode ter muito dinheiro, mas se ele tiver um acidente automobilístico ele só vai para um canto, o Trauma, e é bem atendido lá. Espero que, não a proposta que a presidente fez, mas a dos governadores, passe e traga um incremento de R$ 350 milhões para a saúde público no Estado, coisa que não é muito, mas é algo diante do que temos investido.
JORNAL DA PARAÍBA - O secretário de Segurança demonstrou preocupação com relação às explosões de caixas a bancos e considerou que há facilidades. Queria saber sobre a sensação de insegurança, o que o Estado tem feito?
ENTREVISTADO - Os bancos deveriam ser responsabilizados. Polícia, que é pública, não é para fazer segurança privada de dinheiro de instituição financeira. Banco, que pega seu dinheiro segurado, e fica todo mundo de olho, tem que ser responsabilizado, qualquer coisa que faça aqui eles apelam que a legislação tem que vir federal. Ou a segurança tinha que ser feita pelo banco ou que das 17h às 7h da manhã o banco retirasse o dinheiro e voltasse no outro dia, acabava tudo isso. Mas o banco não quer pagar um carro-forte para poder proteger o dinheiro. Isso é Brasil. Eu fico indignado com essa discussão de caixa eletrônico. A polícia tem que estar nas ruas para proteger as pessoas, para fazer operações, como nunca se viu tantas sendo feitas. Foram detidas 55 mil em 5 anos. A polícia trabalha, poucos são os casos que não têm resolução.
JORNAL DA PARAÍBA -O senhor tomou a frente na defesa do mandato da presidente Dilma Rousseff aqui na Paraíba, inclusive realizando um ato contra o impeachment.
ENTREVISTADO - Eu sou produto das lutas por democracia, dos movimentos organizados, isso não quer dizer que em algum momento eu não me confronte. Sei como seria terrível para este país se nós embarcássemos numa aventura de fazer mudança de governante apenas por impopularidade. Seria terrível isso. Porque quem entrasse não teria legitimidade. Aécio (Neves) não tem legitimidade para encarnar o sentimento da população. O povo começou a acordar sobre a aventura que seria apear alguém do poder num regime democrático fixo simplesmente por impopularidade, já que você não tem um crime, a não ser esse negócio de pedalada fiscal, que pelo amor de Deus, todo mundo fez e se dizia que não tinha problema. Parte da Câmara passou o ano sem se preocupar com economia e políticas públicas, foram secando o Brasil, para tirar uma presidente. Isso é golpismo.
JORNAL DA PARAÍBA - Então o senhor se considera um dissidente, que tem inclinação pró-impeachment? Há um movimento da militância em lançar a sua candidatura para presidente da República. O senhor tem se articulado para isto?
ENTREVISTADO - Não, porque não há uma decisão. O partido é independente, desde as eleições é a posição mais importante. O PSB tem que ter muito cuidado porque uma coisa - e concordo se assim fosse - era dar uma alternativa ao povo do Brasil que era dar além do que foi construído nesses quinze anos, mas sem negar o que foi construído, porque é cuspir no próprio prato e negar transformações importantes. Acho que essa dicotomia PT-PSDB faliu. Acho que o PSB representa isso, e Eduardo Campos era um representante disso, mas a história foi cruel. Quanto ao desejo da militância, pretendo é fazer o melhor governo possível. Sei da responsabilidade e acho que cada movimentação que vejo no meio de uma transição como esta, de fragilização, eu vejo muita gente se lançando como se o país fosse um defunto. Acho isso terrível e não constroem absolutamente nada. Primeiro temos que recuperar a estabilidade para que os investimentos retornem ao nosso país. Fora isso, eu acho suicídio, a minha missão é governar o Estado. Se me perguntar sobre o meu futuro, eu nunca pensei na minha vida, nunca fiz projeção por tantos anos. A disputa de governador decidi em poucos meses e fui. Acho que o povo brasileiro no momento não está querendo saber de candidato, mas de projetos.
JORNAL DA PARAÍBA - Há uma eleição que se avizinha mais próxima, que são as municipais. Os planos do PSB são mirar nas cidades maiores, sobretudo na capital, a qual o senhor já governou por oito anos?
ENTREVISTADO - Em João Pessoa o nome é João (Azevedo). Estamos bem em Sousa, discutindo como será em Patos, temos que fechar uma discussão com os companheiros se teremos candidato ou apoiaremos alguém em Campina Grande, mas em João Pessoa, que é onde surgimos, onde o modelo de gestão foi implantado de uma forma mais ousada e que a gente percebeu que ao longo dos anos foi tolhido.
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