CULTURA
Ficção científica ambientada na literatura brasileira
Editora Casa da Palavra lança coletânea de contos de ficção científica brasileira organizada por Braulio Tavares.
Publicado em 17/12/2011 às 9:10
O que o carioca Fausto Fawcett, compositor de 'Kátia Flávia', a Godiva do Irajá, e a cearense Rachel de Queiroz (1910-2003), pilar do romance regionalista, têm em comum? A resposta reside folheando as Páginas do Futuro (Casa da Palavra, 152 páginas, R$ 34,90), coletânea de 12 contos de ficção científica brasileira organizada por Braulio Tavares.
É a primeira antologia que Tavares produz exclusivamente de histórias do gênero feitas no Brasil. Para o paraibano, a ficção científica é bem parecida com o rock'n'roll. Bandas do gênero, seja na Polônia ou no México, aprendem primeiro o rock anglo-saxônico.
“Depois cada país procura dar a sua interpretação e seu viés”, analisa por telefone.
Além dos autores já citados, completam a lista Joaquim Manuel de Macedo, Rubem Fonseca, Luiz Bras, Finísia Fideli, André Carneiro, Ademir Assunção, Fábio Fernandes, Ataíde Tartari, Jeronymo Monteiro e Oswaldo Bereford.
Braulio Tavares atenta que não é necessário fazer ficção científica envolvendo o folclore nacional. “Poucos são ambientados no Brasil”, observa. “O importante é ser ambientado na literatura brasileira.”
ANTROPOFAGIA
Partidário de uma 'brasileirização' dos conteúdos frente ao consumo exacerbado oriundos da cultura norte-americana, Braulio encontra na bagagem de Fausto Fawcett um exemplo que reflete o momento literário do gênero. Em obras como Santa Clara Poltergeist (1990) e Básico Instinto (1992), o autor carioca nos transporta para uma Copacabana inserida em um futuro urbano cyberpunk.
Outro exemplo é no conto de Rachel de Queiroz: nas explorações espaciais, uma imensa nave terrestre recebe clandestinamente um pequeno humanoide. Escondido dentro da nave, ele aprende a pilotá-la e mata toda a tripulação para voltar para casa. “Uma fábula sobre o colonialismo”, compara a história da autora de O Quinze presente na publicação.
Mais um paralelo ao que se refletia na época é o conto do romancista de A Moreninha, Joaquim Manoel de Macedo, republicado pela primeira vez em Páginas do Futuro. Meio ingênua e despretensiosa de acordo com Tavares, a narração em tom humorístico é acerca de rumores do final dos tempos devido à passagem de um cometa, em 1857, ano da sua publicação.
A curiosidade de autores nacionais que são atípicos neste território ficcional é que são realmente “casos isolados”, como analisa Braulio. “Não houve motivação para eles continuarem, apesar de serem textos muito bons”, observa. “Terminaram se dedicando a outro tipo de literatura.”
A repercussão da sci-fi se deu com os 'enlatados' gringos nas telonas. Uma teoria da força do gênero nos Estados Unidos é sobre o grande filão de produções milionárias da meca hollywoodiana.
Sobre isso, o organizador acha a literatura muito mais rica que o cinema. “A custo zero frente aos efeitos especiais de milhões de dólares, a mesma história, com os mesmos elementos, é feita sem nenhum gasto no papel.”
Envolvendo ciência e imaginação, o gênero que atravessa a história da literatura mundial há mais de 150 anos não se resume apenas a invasões extraterrestres ou espaçonaves. "Isso é apenas 0,1% dos temas", garante Tavares.
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