Figueirense x Botafogo-PB: o futebol, as dores, os momentos de felicidade

Crônica da vitória de virada por 2 a 1 do Belo em cima do Figueirense, pela Série C do Campeonato Brasileiro 2023, por Phelipe Caldas.

Foto: Patrick Floriani/FFC

*Crônica inspirada em e dedicada a Mairana Medeiros, uma botafoguense fanática que, após viver um dos momentos mais difíceis de sua vida, se declarou genuinamente feliz por estar numa tarde de domingo, no Orlando Scarpelli, testemunhando feitos extraordinários de um Belo até dia desses desacreditado.

A felicidade absoluta não existe.

Não enquanto totalidade, como algo indivisível e estanque.

E que bom que ela não existe desta forma inalterada e previsível.

A invariabilidade da felicidade tornaria tudo parecido demais, monótono demais, indiferente demais.

Inviabilizaria os arrebatamentos. Os incríveis “momentos de felicidade” que fazem tudo o mais valer a pena.

Sim, momentos de felicidade.

É essa a noção que me impulsiona.

O instante. O estalo de prazer. O ato vivido justo quando ele está sendo sentido. O microssegundo de falta de ar, de arrepio da pele, de embargo da voz, de explosão incontida que reverbera em grito.

Mais do que uma felicidade onipresente, o que faz mesmo a vida valer a pena é a quebra de expectativa, é o encontro furtivo e fortuito que vez ou outra temos com o imponderável.

E, nesse aspecto, as dinâmicas do futebol são perfeitas para os sonhos e para as paixões. Para as percepções sobre essa sensação que tento descrever aqui.

Pensem na relação do Botafogo-PB com a Série C.

É a décima temporada ininterrupta do Belo na terceira divisão.

Já foram muitos os anseios, os desejos, as torcidas. Idas e vindas pelos mais diversos campos de futebol Brasil afora. Expectativas criadas e, invariavelmente, frustradas ao longo de uma década.

Três quase acessos, dois quase rebaixamentos. E o torcedor lá, dia após dia na Série C, renovando esperanças.

Até que, na mais improvável das temporadas, após o mais difícil início de ano dos últimos tempos, o Belo resolveu engrenar.

Depois de cinco jogos, segue invicto. São três vitórias e dois empates. Um início de campanha inédito em todo esse tempo.

Mais impressionante, duas dessas vitórias fora de casa, incluindo aí a vitória desse domingo (28), em que o Belo venceu de virada o Figueirense por 2 a 1. Jogando melhor, se impondo, atacando mais e mais, sem recuar e sem se intimidar.

Não restam dúvidas, o botafoguense está feliz.

Mas não é uma felicidade absoluta. Nunca é.

É felicidade forjada em quem já chorou em 2016 com o gol do Boa Esporte aos 50 minutos do segundo tempo; é felicidade instaurada no coração de quem já cantou “vamos subir Belo” dez segundos antes do gol do xará de Ribeirão Preto em 2018, aos 47 minutos do segundo tempo; é felicidade sentida na pele de quem já ficou tonto, em 2021, vendo a superioridade evidente do Ituano em mais um último ato que não terminou como todos desejavam.

E é felicidade também de quem, calejado, sabe que não está nada ganho. Que ainda tem toda uma Série C de desafios pela frente antes de começar a acreditar no extraordinário.

É uma felicidade genuína, mas forjada na dor, nas tragédias, no impacto debilitante que todo torcedor já viveu.

É a dor do passado que valoriza o êxtase do presente, afinal. Que permite a desforra festiva após uma vitória para lá de convincente.

Isso é futebol.

Porque só o futebol mesmo para cicatrizar feridas, amenizar dores.

Fazer o mais incrédulo torcedor botafoguense se empolgar, se emocionar, acreditar que a Série B do Brasileirão é logo ali.