“Não reclame de mim aqui nos tribunais não. Reclame de mim a Biden (Joe Biden), que é o homem mais poderoso do mundo”. A declaração é da juíza Conceição Marsicano e foi dirigida a um advogado durante audiência de instrução criminal na semana passada, na Comarca de Bayeux. Os dois e o Ministério Público entraram em rota de colisão sobre a continuidade do interrogatório de um réu.
Durante a audiência o advogado lembrou que a Lei de Abuso de Autoridade, publicada em setembro de 2019, proíbe a continuidade do interrogatório quando o investigado manifesta, desde o início, o seu desejo de permanecer em silêncio.
Após o embate, a magistrada disparou: “Por mais respeitoso que seja, quero dizer que a gente vive um momento de atipicidade. Eu, particularmente, não me sinto intimidada. Agora se algum outro juiz está pisando fora da linha, isso é problema dele. Vossa excelência colocou como se fosse uma ameaça. Eu tenho conhecimento dela (da lei de abuso). Agora me ameaçar? Eu vou tornar a dizer. Não reclame de mim aqui nos tribunais não. Reclame de mim a Biden, que é o homem mais poderoso do mundo”, disse Conceição Marsicano.
Veja vídeo completo:
A proibição a que se refere o advogado está no artigo 15 da Lei 13.869, que diz:
No vídeo, Fernandes Braga assegura que não ameaçou ou teve a intenção de ameaçar ninguém.
Histórico ‘linha dura’
A juíza Conceição Marsicano é conhecida por ser ‘linha dura’. Em 1994 ela foi destaque numa reportagem do Fantástico, da Rede Globo, que mostrou o trabalho dela no combate à pistolagem no sertão do Estado.
Na época a magistrada trabalhava na Comarca de Coremas e andava escoltada por policiais.
Ano passado a Conceição Marsicano teve o nome cogitado para disputar a prefeitura de Bayeux.
O prosseguimento do interrogatório do réu, mesmo quando ele afirma que quer fazer uso do seu direito ao silêncio, configura o crime de abuso de autoridade previsto no Art. 15, Paragrafo único, I da Lei 13.869/2019, que assim dispõe:
Art. 15. Constranger a depor, sob ameaça de prisão, pessoa que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, deva guardar segredo ou resguardar sigilo:
Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem prossegue com o interrogatório:
I – de pessoa que tenha decidido exercer o direito ao silêncio;