POLÍTICA
Calvário: núcleo administrativo operacionalizava 'mesada' de R$ 500 mil para Ricardo Coutinho
Os ex-secretários Livânia Farias, Waldson Souza e Gilberto Carneiro seriam os 'cabeças' do esquema.
Publicado em 17/12/2019 às 16:51
O esquema de recebimento de propina através de contratos de gestão pactuada nas áreas da saúde, na Paraíba, que movimentou mais de R$ 1 bilhão, teria rendido uma mesada de R$ 500 mil ao ex-governador Ricardo Coutinho (PSB). Os detalhes de como operavam os três núcleos - político e econômico e financeiro - foram detalhados na decisão do desembargador do Tribunal de Justiça da Paraíba, Ricardo Vital, que autorizou, nesta terça-feira (17), a deflagração da Operação Juízo Final, um desdobramento da Operação Calvário.
Os ex-secretários Livânia Farias, Waldson Souza e Gilberto Carneiro, seriam os 'cabeças' do núcleo econômico. Além de estruturar mecanismos de ocultação desses recursos, os três eram os principais responsáveis pela escolha de agentes econômicos que participariam do esquema, através do empresário Daniel Gomes, operador da Cruz Vermelha e do Instituto de Psicologia Clínica Educacional e Profissional (Ipcep).
Segundo informações do Ministério Público da Paraíba, o dinheiro público, via excedentes contratuais, caía nas contas dos integrantes das corporações, mas retornava (como destino final) aos agentes políticos, por intermédio de integrante do núcleo administrativo e/ou do financeiro operacional, os quais tinham como tarefas, dentre outras, recolher a propina (abastecendo o caixa da organização criminosa) e dar ao produto delas uma aparência lícita, mediante técnicas de lavagem. Assim, de 2011 a 2019, a Cruz Vermelha recebeu mais de R$ 980 milhões e o Ipcep recebeu mais de R$ 270 milhões.
Em postagem nas redes sociais, Ricardo Coutinho disse que vai retornar à Paraíba e se apresentar à Justiça, "para provar ser inocente". O ex-governador está fora do país, segundo ele próprio em férias planejadas com antecedência.
Veja a participação dos três principais integrantes do núcleo administrativo:
Livânia Farias
Ex-secretária da Administração do Estado da Paraíba, foi mantida no cargo pelo atual governador João Azevêdo até 15 de março deste ano. Na gestão de Ricardo Coutinho, também foi Procuradora-Geral do Estado. As investigações apontam que ela era responsável pela arrecadação da propina 'por dentro e por fora', enviando servidores (como Leandro Azevedo e Laura Farias) por todo o Brasil para pegar valores envolvidos na operação. Ela combinava e controlava valores de propinas de diversos outros serviços.
A participação de Livânia no esquema teve início na campanha de Ricardo Coutinho ao governo em 2010, quando Daniel Gomes entregou a ela R$ 200 mil para a campanha do socialista. Ela narrou em sua delação premiada que, após a vitória, intermediou a doação de mais R$ 300 mil ao núcleo. Mais adiante, em 2011, quando Ricardo convidou Daniel Gomes a implementar o sistema de Organizações Sociais na Paraíba, ela, em conjunto com Waldson de Souza e Jobino Neto participaram dos acordos de propinas.
Livânia também participou do processo de escolha do Ipcep para administrar o Hospital Geral de Mamanguape, em meados de 2014, que foi igualmente direcionado, segundo o MP. No contrato foi inserida uma cláusula que conferia pontuação à equipe técnica da OS. "Esse direcionamento teria sido uma contrapartida a um pagamento de propina proposto por Ricardo Coutinho, no valor de R$ 1 milhão, a fim de que o colaborador assumisse o HGM, bem como o adiantamento de vários meses de propina, o que totalizaria uma entrega, em 2014, de R$ 5,24 milhões a Ricardo.
Waldson de Souza
Ex-secretário de estado de Planejamento, Orçamento e Gestão da Paraíba, exonerado no final de abril deste ano. Foi Secretário de Saúde e Secretário de Estado do Desenvolvimento e Articulação da Paraíba (2014-2016), no governo de Ricardo Coutinho. Ele era o responsável pelos acordos políticos e apoios, mediante repasse de dinheiro a prefeitos, deputados e candidatos em todo o Estado (nos 223 municípios paraibanos).
Segundo o MP, além de aviar esquemas de arrecadação e ocultação de propinas, Waldson 'se refestelava' com os privilégios concedidos pelo dinheiro de Daniel Gomes, como pagamento de despesas de viagens caras para o Sambódromo e o Rock In Rio, ambos realizados no Rio de Janeiro.
Gilberto Carneiro
Ex-procurador-geral do estado, mantido no cargo pelo atual governador até o fim de abril deste ano. No governo anterior (gestão de Ricardo Coutinho), ocupou também o cargo de secretário de estado da Administração. Gilberto foi responsável pela ponte com os órgãos de controle e judiciário, exercendo influência em todos os assuntos, inclusive, na escolha de membros do Tribunal de Contas do Estado, do Ministério Público até do TJPB com o aval do ex-governador Ricardo Coutinho e do atual governador. Também integra diversos conselhos de administração de empresas do estado.
Como homem de confiança de Ricardo Coutinho, Gilberto Carneiro teve, em tese, participação decisiva para a manutenção da cúpula da OCRIM (e de seu projeto), no âmbito do Poder Executivo Estadual, especialmente porque teria se transformado no agente de interlocução do Executivo frente aos demais Poderes e órgãos, sobretudo de fiscalização.
Gilberto também mantinha uma espécie de 'caixa 2' do caixa da propina em parceria com Edvaldo Rosas, então presidente estadual do PSB. Segundo narrou Ivan Burity em sua colaboração premiada, desde 2012, parte das 'propinas' arrecadadas de empresários era, sempre que possível, divido com Gilberto e Edvaldo Rosas, sem o conhecimento de Livânia, que tomava conta do financeiro da organização.
Veja a cobertura completa da Operação Calvário
- Interceptações telefônicas mostram Ricardo tratando do recebimento de valores com a Cruz Vermelha
- Alvo de mandado de prisão na Operação Calvário – Juízo Final, Ricardo Coutinho está fora do país
- Calvário: Ricardo, Estela, Cida e vários agentes públicos são alvos em nova fase da operação
- Juízo Final: Gaeco cumpre mandados no Palácio, Granja Santana e endereços de conselheiros do TCE
Operação Juízo Final
A Operação Juízo Final é coordenada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público da Paraíba, e conta com auxílio da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União (CGU) e Ministério Público Federal. A ação resultou em 17 mandados de prisão e 45 de busca e apreensão contra suspeitos que comporiam a suposta organização criminosa.
A relação inclui os grupos político, administrativo e econômico, além dos responsáveis pela operacionalização do esquema. O ex-governador Ricardo Coutinho, alvo de mandado de prisão, é apontado como o cabeça na suposta organização criminosa.
Estão sendo cumpridos mandados de prisão contra os seguintes agentes públicos e empresariais:
1. Ricardo Vieira Coutinho (PSB)
2. Estela Bezerra (PSB)
3. Márcia Lucena (PSB)
4. Waldson de Souza
5. Gilberto Carneiro
6. Cláudia Veras
7. Coriolano Coutinho
8. Bruno Miguel Teixeira
9. José Arthur Viana
10. Breno Dornelle Pahim
11. Francisco das Chagas Pereira
12. Denise Krummenauer Pahim
13. David Clemente Correia
14. Márcio Nogueira Vignoli
15. Valdemar Ábila
16. Vladmir dos Santos Neiva
17. Hilário Ananias Queiroz Nogueira
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