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POLÍTICA

Projeto quer proibir recursos públicos em shows com apologia ao crime em João Pessoa; entenda

A proposta da capital paraibana é semelhante à que foi apresentada em São Paulo, conhecida como "PL anti-Oruam".

Publicado em 15/02/2025 às 8:27 | Atualizado em 15/02/2025 às 8:50


				
					Projeto quer proibir recursos públicos em shows com apologia ao crime em João Pessoa; entenda
Proposta original ficou conhecida como 'PL anti-Oruam', referência ao rapper.. Divulgação

Um projeto de lei que está em tramitação na Câmara Municipal de João Pessoa propõe proibir o uso de recursos públicos em shows e eventos culturais com artistas que façam apologia ao crime. A proposta é semelhante ao projeto que ficou conhecido como “PL anti-Oruam”, em referência ao rapper Oruam, apresentado por uma vereadora na cidade de São Paulo.

Críticos de projetos semelhantes, espalhados pelas capitais do país, afirmam que essas propostas são uma forma de “censura” e que afetam especialmente artistas dos gêneros musicais funk ou rap (leia mais abaixo).

Em João Pessoa, a proposta foi apresentada pelo vereador Milanez Neto (MDB). Segundo o texto, o objetivo é vedar qualquer forma de incentivo financeiro, pela administração pública municipal, a shows, eventos culturais e artísticos que contenham conteúdo que faça apologia ao crime, especialmente ao crime organizado.

A proposta também define o que seria considerado apologia ao crime:

  • Exaltar ou glorificar facções criminosas, grupos armados ilegais ou organizações criminosas;
  • Incentivar a prática de atos ilícitos, incluindo o tráfico de drogas, o porte ilegal de armas e outros delitos previstos na legislação penal;
  • Conter letras, mensagens ou representações visuais que promovam ou estimulem a violência, o desrespeito às autoridades ou a corrupção.

Além disso, determina punições para aqueles que descumprirem a lei, incluindo servidores públicos. As penalidades vão desde a anulação do apoio ou patrocínio até a imposição de sanções administrativas aos agentes públicos responsáveis pela concessão do apoio e a inclusão dos artistas em um cadastro de impedidos de receber apoio financeiro do município por um período de até cinco anos.

Autor do projeto afirma que objetivo é “valorizar a cultura”


				
					Projeto quer proibir recursos públicos em shows com apologia ao crime em João Pessoa; entenda
Foto: divulgação/CMJP.

O vereador Milanez Neto afirmou ao Jornal da Paraíba que a proposta surgiu após a última campanha política e a percepção do crescimento do tráfico de drogas em João Pessoa. Ele também disse que festas patrocinadas com dinheiro público estão ocorrendo em algumas comunidades da cidade e têm ligação com o tráfico de drogas.

Apesar de citar essas supostas festas, o parlamentar não soube dar um exemplo de artista ou uma apresentação específica que fizesse apologia ao crime organizado, conforme define o projeto apresentado.

Milanez também disse que o principal objetivo do projeto de lei é “valorizar a cultura” e que, segundo ele, serão afetados aqueles que realizam referências a drogas ou facções criminosas.

“[O objetivo é] pegar os poucos recursos que nós temos para investir na cultura da nossa cidade e fazer o investimento em quem realmente promove a cultura do nosso município. O intuito principal é não desvirtuar o recurso público, o escasso recurso público que nós temos, para colocar onde realmente não deveria jamais nem se pensar em colocar recurso público”, afirmou o vereador.

No texto do projeto, o vereador afirma que a proposta se fundamenta no artigo 37 da Constituição Federal, que determina que a administração pública deve obedecer a certos princípios, entre eles a moralidade administrativa. Ele também argumenta que é dever do poder público zelar pela ordem pública.

“A promoção da cultura deve ocorrer de maneira responsável, assegurando que os eventos financiados com recursos públicos não colidam com os valores que norteiam a sociedade e o Estado Democrático de Direito”, diz o texto do projeto.

O PL “anti-Oruam” e a polêmica de censura ao funk e rap


				
					Projeto quer proibir recursos públicos em shows com apologia ao crime em João Pessoa; entenda
Rapper Oruam.

O projeto do vereador Milanez Neto é semelhante ao apresentado pela vereadora Amanda Vettorazo (União Brasil) na Câmara Municipal de São Paulo, que ficou conhecido como PL “anti-Oruam”, em referência ao rapper Oruam. A proposta quer impedir que artistas cujas letras abordam temas relacionados ao crime organizado e ao consumo de drogas recebam dinheiro público.

Segundo um levantamento feito pelo UOL, o projeto inspirou iniciativas semelhantes em outras 12 capitais — incluindo João Pessoa — e no Congresso Nacional. O site cita que, além da capital paulista, propostas parecidas também foram apresentadas em Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Campo Grande, Fortaleza, Curitiba, Vitória, Porto Alegre, Cuiabá, Porto Velho e Natal.

Apesar de não citar diretamente o rapper Oruam na proposta ou um gênero musical específico, a vereadora criou um site com a imagem do rapper para incentivar os vereadores a protocolarem o projeto em outras cidades. Oruam é filho do traficante Marcinho VP, que está preso desde 1996.

A proposta também chegou ao Congresso Nacional, quando o deputado Kim Kataguiri (União Brasil - SP), coordenador do MBL (Movimento Brasil Livre), apresentou o texto na Câmara. No Senado, a iniciativa foi do senador Cleitinho (Republicanos - MG).

O rapper Oruam comentou a proposta nas redes sociais e afirmou que ela não ataca apenas ele, mas todos os artistas da cena.

O rapper e compositor Borges também criticou o projeto.

"Que dinheiro público que a gente ganha? Cadê, ué? Cadê a Lei Rouanet pra nós? Não tem isso pra nós, não. Esquece, é só preconceito mesmo e tentativa de ganhar seguidor. A gente não faz show em prefeitura, a gente já não incomoda vocês, a gente só faz show em lugar privado", afirmou o rapper.

Já o rapper MD Chefe afirmou que a proposta é uma tentativa de ganhar mídia através da popularidade de Oruam e que não é uma emergência para se discutir no estado, frente a outros assuntos.

"Vocês devem respeitar mais o rap. O rap, mais do que qualquer governo, incentiva milhares e milhares de jovens a procurar outra opção. Quando a pessoa vem de baixo, ela tem a opção da pobreza ou da criminalidade. Se ela consegue, com uma terceira opção, como o rap, crescer, ela vai ser perseguida. É isso que vocês estão me dizendo?", afirmou.

A vereadora Amanda Vettorazo afirma que o objetivo do projeto não é criminalizar ou censurar o rap ou o funk e diz que quer apenas proibir que a prefeitura contrate artistas que façam apologia ao crime.

Em João Pessoa, o parlamentar Milanez Neto também nega que o projeto apresentado na cidade seria uma tentativa de “censura” a determinados artistas ou apresentações. Além disso, Milanez Neto nega que o projeto de lei vise atingir determinados ritmos específicos, como rap ou funk, ou tenha relação com determinado artista.

“Não é porque você faz rap e você faz funk que você vai fazer apologia ou tem envolvimento com tráfico de droga. Eu sou uma pessoa que, na minha adolescência toda, ouvi diversos funks. Gostava, inclusive, de funk que falava sobre a vida da comunidade, a vida da favela. A gente não pode pegar o errado e colocar para o certo, nem o certo para o errado. Nós temos outros tipos de música também, que não são nem funk nem rap, que fazem apologia ao tráfico de drogas e têm um movimento com o tráfico de drogas”, disse o vereador.

Advogado alerta que conceito de apologia ao crime é subjetivo

Em entrevista ao Jornal da Paraíba, o advogado constitucionalista Henrique Toscano destacou que o artigo 5º da Constituição Federal garante a livre expressão da atividade intelectual, artística e musical. Para ele, projetos de lei que impeçam o poder público e suas entidades de patrocinar artistas que utilizam seus shows para fazer apologia ao crime são controversos.

Toscano questiona a subjetividade do conceito de apologia ao crime. “O primeiro ponto crítico dessa proposta é: a quem cabe definir o que é o crime de apologia? O conceito de apologia ao crime não é absoluto, e sua interpretação pode variar”, explica o advogado. O projeto do vereador de João Pessoa não deixa claro como essa fiscalização aconteceria, caso a proposta fosse aprovada.

O advogado destaca que muitas expressões musicais, especialmente o rap, são manifestações de protesto que mencionam a criminalidade sem necessariamente incentivá-la. “A própria história do grupo Racionais MCs ilustra esse cenário. Isso difere substancialmente de músicas e composições que nitidamente fazem apologia ao crime, incentivando práticas criminosas, promovendo o uso de drogas ou enaltecendo criminosos por suas ações", argumenta. O advogado entende que essa diferença nem sempre está clara.

Para Toscano, quando a definição de apologia ao crime se baseia em critérios vagos, há um risco de censura prévia. Ele alerta que isso pode abrir margem para decisões arbitrárias e restritivas à liberdade de expressão.

O advogado também reconhece que o objetivo das propostas é impedir que o poder público financie eventos que possam ferir a moralidade pública. No entanto, ele ressalta que é necessário equilibrar essa intenção com a proteção dos direitos fundamentais.

Toscano também enfatiza que, embora a liberdade de expressão seja um direito fundamental, ela não é absoluta. "A liberdade de expressão deixa de ser uma garantia legítima quando utilizada deliberadamente para cometer crimes ou para incentivar e conclamar pessoas à prática de atos ilícitos, como no caso da apologia ao crime", conclui.

Criação do Sistema Nacional da Cultura já veta incitação a crimes

O advogado constitucionalista Tibério Almeida Brito lembra que, em abril de 2024, foi promulgado o marco regulatório do Sistema Nacional de Cultura, que estabelece diretrizes para o pleno exercício dos direitos culturais. A legislação federal já prevê que tais direitos não devem incitar crimes ou afrontar a moralidade pública.

O marco regulatório estabelece que a liberdade cultural deve ser exercida dentro de certos limites: “O pleno exercício dos direitos culturais não deverá possuir caráter político-partidário ou personalista, tampouco afrontar a dignidade e a moralidade pública ou incitar a prática de crimes”, define a lei. Para Tibério, essa regulamentação já equilibra a questão da liberdade de expressão com a necessidade de preservar a ordem pública.

O advogado também entende que a proibição da proposta visa evitar a prática de desordem, com o intuito de trazer paz e tranquilidade à sociedade. Segundo ele, a censura só se configura quando não há um motivo legítimo para a legislação.

“A liberdade de expressão tem esse limite e é um direito que não se encerra, mas ela precisa dar espaço para a regulação, para evitar a bagunça, para evitar a desordem, como é o caso da apologia ao crime. Então, a apologia ao crime traz esse limite; portanto, não pode ser considerada como censura”, afirmou.

Outro ponto controverso levantado por Tibério é a competência para legislar sobre o tema. Ele explica que a proposta se enquadra no âmbito do direito administrativo e penal, cuja regulamentação, via de regra, é de competência exclusiva da União. Estados e municípios só podem legislar sobre o assunto através de projeto complementar, se for de interesse local, sempre dentro dos limites estabelecidos pela Constituição Federal. Já a proposta apresentada na Câmara Municipal de João Pessoa é um projeto de lei ordinária.

Imagem

Grace Vasconcelos

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