CULTURA
Conheça artistas da Paraíba que resistiram à ditadura militar
Nomes constam no relatório final da Comissão Estadual da Verdade e da Preservação da Memória do Estado da Paraíba, publicado em 2017.
Publicado em 05/04/2024 às 6:41 | Atualizado em 05/04/2024 às 16:41
Durante o período da ditadura militar no Brasil, vários artistas da Paraíba se opuseram ao regime. Obras sofreram censura, músicos, atores e cineastas foram presos e tiveram parte da vida e carreira marcada pela sombra de uma ditadura militar. Agora, 60 anos depois, aparelhos culturais como teatros levam os nomes de quem resistiu com arte ao regime militar na Paraíba.
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Nesta reportagem, o Jornal da Paraíba apresenta a história de resistência de alguns nomes da cena cultural que se opuseram à ditadura militar no Brasil.
Os nomes aqui apresentados constam no relatório final da Comissão Estadual da Verdade e da Preservação da Memória do Estado da Paraíba, publicado em 2017. O documento resgata a história da Paraíba em diversas vertentes, e destaca o contexto de ditadura militar.
Vários outros nomes importantes na luta contra o regime, que também faziam parte da cena cultural paraibana, também tiveram papel importante nesse contexto.
Artistas da Paraíba que resistiram à ditadura militar
Paulo Pontes
Os jovens paraibanos conhecem Paulo Pontes como nome de um dos teatros localizados em João Pessoa. Quem dá nome ao lugar é alguém com relação estreita com a dramaturgia.
Paulo Pontes nasceu em Campina Grande, no Agreste paraibano, em 1940, e viveu apenas 36 anos. Morreu precocemente vítima de um câncer, há mais de 45 anos.
Jornalista e dramaturgo, Paulo Pontes uniu a paixão pela arte com a força política. Elaborou diversos esquetes teatrais durante o regime militar e desenvolveu atividades de formação com outros artistas.
Paulo lutou pela liberdade de imprensa e acreditava numa democracia viva. A resistência à ditadura foi materializada pelo dramaturgo no show "Opinião", escrito por ele com duras críticas ao regime.
Zezita Matos
A atriz paraibana Zezita Matos também foi uma das que resistiu ao regime militar no estado.
Na época do golpe, Zezita era estudante de Filosofia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e já atuava no grupo de "Teatro Popular de Arte", junto com nomes como Vladimir Carvalho e Breno Matos.
Ela chegou a fazer esquetes teatrais tratando da luta das camponesas em municípios como Sapé, Mari e Rio Tinto.
Nas vésperas do golpe militar, Zezita estava ensaiando no Lyceu Paraibano, sob a direção de Rubens Teixeira, a peça "Eles não usam Black-Tie”, de Gianfrancesco Guarnieri. A montagem não foi concluída.
Em relatos presentes no relatório da Comissão Estadual da Verdade e da Preservação da Memória do Estado da Paraíba, Zezita afirmou que o militares chegaram a procurá-la, e que ela escapou da prisão "por pura sorte".
A atriz conseguiu escapar porque a chamavam por Zezita, enquanto o seu nome verdadeiro era Severina de Souza Pontes.
Zezita passou a viver escondida na casa de um tio, pois a casa de seu pai era constantemente vigiada pelos militares.
Ednaldo do Egypto
Ednaldo do Egypto foi um cineasta paraibano com forte atuação política. Fez parte de vários grupos de teatro e hoje dá nome a um teatro localizado em João Pessoa.
Na ditadura militar, foi fichado como parte de "um grupo de elementos cujos integrantes, ligados ou comprometidos com a ideologia marxista, pertenciam à "Sociedade Cultural Augusto dos Anjos" e à "Juventude Teatral de Cruz das Armas".
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Na ficha de Ednaldo continha, ainda, a informação de que ele era "um dos responsáveis por encenações de peças subversivas".
W. J. Solha
W. J. Solha escreveu, junto com o argentino José Alberto Kaplan, a Cantata Pra Alagamar. A obra era, claramente, um grito contra a ditadura militar, e conta a história de um conflito real.
Conforme informações obtidas pelo g1, as terras de Alagamar eram habitadas por cerca de 7 mil pessoas, que trabalhavam no local há quase 30 anos e tinham uma organização inspirada nas Ligas Camponesas, proibidas pela Ditadura Militar.
As terras pertenciam a um antigo fazendeiro, que não tinha herdeiros. Quando ele morreu, a área foi alvo de disputa entre os funcionários da fazenda e outros fazendeiros que queriam se apossar do local e expulsar os trabalhadores.
O texto foi apresentado em plena ditadura e representou um importante capítulo na luta contra o regime militar na Paraíba.
Solha também escreveu "Creonte", uma adaptação da tragédia Antígona de Sófocles, que sofreu censura moral, política e religiosa.
Solha é natural do estado de São Paulo, mas é radicado na Paraíba.
Vladimir Carvalho
Vladimir Carvalho é um dos cineastas com maior atuação contra o regime militar. Junto com nomes como Zezita Matos, ele atuou no Teatro Popular de Arte, e nas Ligas Camponesas, encenando peças de teatro para os ruralistas com temas socialistas-comunistas.
O filme “O país de São Saruê” foi dirigida por Vladimir Carvalho, com narração de Paulo Pontes. O filme foi inscrito no Festival de Brasília, e depois de passar pela Comissão de Seleção, foi suspenso pela Fundação Cultural do festival.
A justificativa para a negativa ao filme foi por ele se tratar de uma produção "ideologicamente negativa e contrária à ideia desenvolvimentista do governo federal", segundo o relatório da Comissão Estadual da Verdade.
Vladimir Carvalho também participou do projeto inicial de 'Cabra Marcado para Morrer', de Eduardo Coutinho. No começo das gravações do filme, sobre a vida do líder das ligas camponesas João Pedro Teixeira, toda a equipe foi dispersada por conta do golpe.
Por conta do golpe, a viúva de João Pedro Teixeira, Elizabeth Teixeira, entrou na clandestinidade e mudou de nome.
Anos depois, em 1981, Eduardo Coutinho encontrou Elizabeth e a ajudou a reestruturar a família, agrupando os filhos dela. O filme foi concluído em 1984.
Geraldo Vandré
O músico Geraldo Vandré também lutou contra a censura. A canção “Pra Não Dizer que Não Falei das Flores”, também conhecida como "Caminhando", foi composta por Geraldo e se tornou o hino da resistência à ditadura militar.
Geraldo Vandré buscou exílio para sobreviver durante o regime militar. Em 1973 ele voltou ao Brasil e encerrou a carreira, se tornando recluso.
Apesar de fazer músicas de protesto, com temas de denúncia dos problemas políticos e sociais durante a ditadura, a Comissão Estadual da Verdade relata que seu retorno ao país "causou polêmica" pelo confronto às posições que assumia no passado. Ele chegou a compor uma canção em homenagem à Força Aérea Brasileira, "Fabiana".
A Comissão da Verdade não conseguiu concluir o que aconteceu com Vandré nesse retorno ao Brasil e afirma que ele mesmo garante que não foi torturado e dispara que não quer mais falar sobre o assunto.
Maria Valéria Rezende
A escritora e ativista Maria Valéria Rezende, atuou fortemente contra o regime militar no campo da educação.
Ela criou projetos de educação de jovens e adultos, liderou movimentos na zona rural da Paraíba, numa época em que o acesso à educação ficou ainda mais difícil. Maria Valéria nasceu em São Paulo, mas é radicada na Paraíba desde a juventude.
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